sábado, 13 de abril de 2013

PERFIL DO AUTOR - ENTREVISTA - Albarus Andreos

Abril 2013
ALBARUS ANDREOS
 
Bacharel em ciências e engenheiro mecânico, iniciou em 1993 o romance que viria a ser a saga de ficção fantástica intitulada A Fome de Íbus. Foi um dos cinco vencedores do concurso Moby Dick, pela editora Cosac Naify e vencedor do concurso de contos da UNIMEP, em 2008, quando se pós-graduou em Língua Portuguesa Voltada a Formação de Leitores. Em 2008 publicou um conto na coletânea Anno Domini, Manuscritos Medievais, pela editora Andross, tendo participado ainda da coletânea A Batalha dos Deuses (Novo Século, 2011) e Dragões (Draco, 2012). Participa de blogs com resenhas, opina e critica os autores nacionais de literatura fantástica. Nasceu em Tupã, estado de São Paulo, aos 19 dias de outubro de 1967. É casado é tem três filhos. 

Fontes da Ficção – Albarus, primeiramente, agradeço por nos conceder esta entrevista e começo pedindo para que fale um pouco do início de sua carreira como escritor.
Albarus Andreos – O início. Sempre é difícil falar do início, pois não existe um “e tudo começou quando...” (pelo menos para mim). Na verdade, quando vi que já tinha começado, já fazia muito tempo que estava lidando com literatura, escrevendo e procurando leituras melhores. Resumindo bem, acho a qualidade do que eu escrevia na forma de redações, na escola, despertava elogios vez ou outra (não sempre!) e eu gostava de ler os livros de literatura indicados pelas professoras para fazer prova (uma coisa que acho que me difere da maioria das outras pessoas). Então, certa vez, ao tentar criar um pano de fundo para uma aventura de RPG de um colega, achei o resultado recompensador (embora ele não) e continuei escrevendo mais e mais e quando vi já passava de cem páginas. Aí eu parei e disse a mim mesmo que ia fazer um livro, assim... sem mais nem menos.


Fontes da Ficção – Bem, vamos às perguntas de praxe: Quais são suas principais influências literárias?
Albarus Andreos Monteiro Lobato, Homero, Anne Rice, Bernard Cornwell, J. R. R. Tolkien, Jorge Amado, Suzanne Clarke, Luís Fernando Veríssimo e Valério Máximo Manfredi (dentre outros). É interessante dizer que, sem ótimas leituras, quando nem se imagina ainda que um dia a escrita entrará na sua vida, isso não vai acontecer, mesmo. O entusiasmo e a vontade de criar vem de boas experiências quando se é leitor (e nunca se para de ser leitor mesmo quando você se torna escritor, o que não é nenhum castigo, mas uma benção). O escritor nada mais é que um excelente leitor que extrapola a posição de receptor e passa a ser também emissor do texto. É uma identificação tão grande com o livro que escrever é uma transcendência natural da experiência de ler. É como escutar um bom papo e naturalmente querer participar dele, falando o que se pensa, também. Por isso não deveria ser nenhum espanto que “cada um dos leitores de Tolkien virou escritor” (é uma crítica que ouvi uma vez, em algum lugar, muito, muito distante...). Tolkien faz isso com a gente.

Fontes da Ficção - Do seu livro de estreia (A Fome de Íbus – Livro do Dente de Sabre, Giz Editorial, 2009) até sua mais recente participação na coletânea da Editora Draco (Dragões), quais foram as principais mudanças que você pôde perceber no escritor Albarus Andreos e na Literatura Fantástica como um todo?
Albarus Andreos – Insisti muito, mas tentei agregar qualidade ao que escrevo. Do início para o agora mudou principalmente o ego que achava que o que estava no papel era imutável e “perfeito” por ser a primeira expressão retratada de alguma coisa (me achava um Henry Miller, ou alguém parecido). Tinha o péssimo hábito de querer parecer erudito e inventada umas frases detestáveis e esquisitas. Em algum momento vi que isso era uma tremenda bobagem e um erro primário e que mudar e aperfeiçoar para obter melhor consonância com o leitor era o segredo (a leitura é SEMPRE uma comunhão de texto e leitor. Portanto minha função é produzir melhores textos. Se a leitura não funciona para o leitor, a culpa é minha). Outra coisa marcante, foi quando li, num livro de Raimundo Carrero, que deixar o texto “na gaveta” por um tempo e depois retomá-lo era o ideal. Na época não entendi bem porquê, mas depois vi que a cada livro que lia, havia uma forma de escrever melhor e então retornava aos meus textos velhos, relia e percebia que o que estava ali permitia muitas melhoras. E a cada dia eu exerço esta Via Sacra de ler e reler e arrumar, sempre. Já descobri coisas tão absurdas nos meus textos que não tenho como negar que essa prática é das melhores. Nesse aspecto, não ter sido publicado antes é um alívio. E vejo a cada dia que, se escrever e, de cara, tentar publicar, vou me arrepender. Sempre, depois de ter publicado o texto, acho zilhões de errinhos cáusticos, frases confusas e mal formuladas, usos de um português capenga, palavras mal empregadas e possibilidades de aperfeiçoamentos para melhorar a dinâmica ou a fluência que me deixam louco! Por isso, eu sempre baixo a bola e, se submeto um texto à revisão profissional de alguém, SEMPRE, encaro às correções e críticas com tremenda humildade e avidez por tornar meu texto melhor (aproveitando o embalo: um pseudo-escritor que submete seu texto à revisão de alguém e depois fica ofendido por ver críticas e sugestões, é uma das coisas mais ridículas do mundo literário, e acontece muito!).

Fontes da Ficção – Albarus, em A Fome de Íbus, muito elogiada por um dos nossos colaboradores (o J. Modesto), nota-se um texto voltado para a aventura, com um grande mergulho na fantasia estilo Dungeon & Dragons, onde nos é apresentado um universo intrigante, deixando um gostinho de quero mais ao final. Sabemos que a história não se encerra nessa livro, tendo uma continuação. Os demais volumes serão publicados? Se sim, quando? Há uma previsão?
Albarus Andreos A Fome de Íbus foi escrito como uma obra só, com mais de mil páginas. Por sugestão de meu antigo editor, na época, o livro foi dividido em quatro partes, sendo a primeira intitulada Livro do Dentes-de-Sabre, exatamente nos apresentando o protagonista que receberia a alcunha de Dentes de Sabre e dando a partida na saga toda. Falar porque não deu certo a publicação de todos os livros pela minha antiga editora é remoer sofrimentos e decepções. O que posso dizer é que todos os quatro livros estão prontos e  serão lançados pela Editora Draco, ainda este ano, em formato digital e depois em papel. É algo que devo aos meus leitores e para o qual não tinha mais respostas plausíveis. Só posso dizer que é de uma realização pessoal indescritível poder entregar tudo o que A Fome de Íbus tem, para o mundo.

Fontes da Ficção – O que você acha do cenário literário brasileiro no geral?
Albarus Andreos Olha só, existe um problema crônico quando o problema livro é tratado em solo brasileiro. Literatura é algo que é difícil de vender em todo o santo canto do mundo mas, em alguns ligares, como no Brasil, isso é agravado pela inércia das grandes editoras, pela falta de uma boa educação de crianças que se tornam adultas sem nunca ter aberto um livro na vida, e de adultos que não tem a mínima necessidade de fazer isso também. O mainstream tem lá suas dificuldades, mas a literatura de entretenimento abriria muito as portas para ela, que realmente é a que importa para a formação de um povo. Portanto vou falar da literatura de entretenimento, que é minha seara.
As grandes editoras são irresponsáveis pelo que fazem quanto ao tratamento com o autor nacional. Prejudicam a formação de massa crítica de onde, uma hora ou outra, eclode um bom escritor e só se preocupa com os lucros que podem obter. Curto e grosso. Não chegam nem perto de apostar em valores nacionais, não praticam a boa política de desenvolver escritores e retê-los em suas casas e desprezam o material nacional a ponto de publicar quase só o que vem de fora. Editoras são empresas que devem se ater ao mercado para sobreviver, mas ter essa premissa em mente sempre e tentar usá-la para justificar o nojo que as grandes sentem pelo autor nacional é, no mínimo, ingenuidade. Seria como dizer que a publicação de novos autores nacionais seria, por si só, responsável pela má gestão dessas editoras como empresas lucrativas, sua péssima política e estratégia de inserção do produto livro, de seu marketing imberbe e divulgação amadora, da ausente penetração nas grandes mídias, de sua insignificante força política e vergonhosa participação da própria literatura dentro da cultura brasileira, restrita às Academias e aos coquetéis cheios de doutores, editores e convidados estrangeiros, pagos com o dinheiro público das universidades Estaduais e Federais.
Os poucos autores nacionais que despontam, caíram nas graças das editoras sabe-se lá como (pela boa sorte?). Talvez as coisas comecem a mudar quando autores consagrados como André Vianco, Raphael Draccon e Eduardo Spohr começarem a mudar algumas regras e abraçarem alguns colegas para as graças das editoras que os publicam. No momento, vejo alguns autores conseguindo ingressar no mercado exatamente pela porta aberta por eles (e através deles). Contudo acho que esses famosos deveriam deixar coleguismos inconsequentes de lado, ler mais e melhores autores nacionais e tentar conhecer seus trabalhos. Um empurrão deles surtiria (e surte) bastante efeito dentro das editoras.

Fontes da Ficção – Agora vamos nos concentrar na Literatura Fantástica Nacional. O que você acha dela? Tem futuro? E os novos autores desse gênero, o que me diz deles?
Albarus Andreos Cara, agora chega a hora de dar a cara a tapa. Nós somos péssimos! Ficamos chorando e falando que a culpa é das editoras, do governo etc. etc., como fiz na resposta anterior, mas há também que se levar em conta uma triste verdade: que o autor nacional não lê, não tem uma boa formação como escritor, não investe nisso e se acha um coitadinho desamparado. Se temos futuro? Meu, amigo... Com raras exceções, futuro é só o que temos. Tem tanto texto ruim fluindo nas redes sociais, tanto material sofrível sendo publicado em coletâneas pagas, tanta gente que fica arregimentando colegas para obter elogios vazios por aí que nem sei o que falar. Dá desgosto. Tem autor que acha que só uma boa história faz um livro sendo que só isso não dá nem um papo de mesa de bar. Tem que ter conteúdo, sim, mas tem que saber contar, saber escrever, ter o controle do corpus e a técnica da boa escrita. TEM QUE TER!
As vezes começo a passar os olhos por um texto que um cara fez em defesa do próprio livro, num blog qualquer, e vejo linhas grosseiras, numa escrita de péssima qualidade, permeada por erros de português. Tem autor que escreve em revista eletrônica na net que é tão ruim que até impressiona. Nunca compraria um livro desses sujeitos. E eles ficam ainda se exibindo num blog de alguém, tentando convencer um potencial leitor que vale a pena lê-los. Meu... Em um parágrafo mal escrito na internet se perde quatrocentas páginas de um livro publicado, se o peão não souber se expressar; se for prolixo, se for raso, repetitivo, se não tiver traquejo... Se há bons autores? Posso citar alguns autores que estão no top level da literatura fantástica nacional, como Giulia Moon, Regina Drummond, Cristina Lasaitis, Viviane Fair e outros. Tem gente que se preocupa com a qualidade do que escreve, graças a Alá.

Fontes da Ficção – Que outros autores da Literatura Fantástica, tanto nacional como estrangeira, você recomendaria?
Albarus Andreos Para recomendar você está falando de excelentes, certo? Nunca li um livro de autor nacional contemporâneo que se encaixe na minha lista de “favoritos de todos os tempos”. Não conheço nenhum! Portanto recomendaria George R. R. Martin, Joe Hill e Philip K. Dick, (só para ficar em um de cada categoria da LitFan: fantasia/ terror/ FC).

Fontes da Ficção – E com relação ao mercado editorial? Nesse “novo mundo moderno”, digitalizado e virtual, você acredita que o livro convencional estará morto num futuro próximo?
Albarus Andreos De jeito nenhum! Quem gosta de livro vai continuar comprando livros de papel. Quem gosta de equipamento eletrônico vai continuar comprando gadgets, dentre eles os que permitem ler livros (que lerão de vez em quando até surgir um treco qualquer que insira, por impulsos bioelétricos, os livros direto no córtex, [para que não precisem ler] – desculpe o sarcasmo, hehehehe...).

Fontes da Ficção - Você vê a internet e seus novos recursos como uma escolha a mais para publicar?
Albarus Andreos – Convém que se estabeleça aqui uma diferença entre o que é publicar, no sentido de tornar público, e o publicar mais restrito, como expressão final da literatura, que é tornar um texto escrito um objeto editorial acabado: um livro. Nesse segundo caso, acho válido como publicar apenas os textos que passem por todos os trâmites inerentes ao processo editorial convencional e no final virem e-books. Livro não é só um monte de linhas escritas, ele deve ser revisado, passar por diagramação e edição etc. Publicar no blog de fulano ou sicrano é uma coisa que não tem muito a ver com livro, não. É meio que passatempo, vaidade, sei lá... Contos podem ser publicados com alguma seriedade assim, resenhas e crônicas também, mas um texto longo não, pois a leitura num computador não traz a mesma imersão da leitura do objeto livro (que, reitero, pode ser eletrônico). Então, alguém que te diz “Ah, publica na internet e poupe uma árvore”, não entende a diferença entre o “tornar público” e o “publicar” mesmo. Poupe uma árvore o cacete! Eu, pelo menos, vejo assim.

Fontes da Ficção - Porque o jovem leitor brasileiro deveria ler suas obras?
Albarus Andreos Oras, ele pode gostar do que escrevo! Sou só um cara que gosta de contar histórias e, por coincidência, algumas delas se tornaram textos. Contudo eu gosto de bons textos e procuro proporcioná-los.
Quando leio algo chato ou ruim me decepciono e não raramente abandono a leitura. Acho fóda quando um garoto está querendo se iniciar na literatura como leitor e logo de cara pega um texto inadequado para aquele momento. Ele se sente um miserável por ter tentado gostar de ler enquanto todo mundo na sua turma odeia isso e faz piada. Se, por outro lado, o livro que vier para a mão dele for legal e envolvente é provável que ele diga para os colegas “vocês não sabem de nada seus xucros” e se torne um leitor de um segundo livro (e assim vamos para o terceiro, para o quarto etc.).
Eu considero que escrever bem, para os jovens leitores, é algo como contribuir para mudar a literatura no país (uau!). Portanto, quis sempre escrever melhor. A cada crítica tentava ver o erro; a cada elogio tentava ver a razão. Acabei desenvolvendo um “Padrão de Qualidade”, para o que escrevo. Sempre achei legar alguém falar “livro de Stephen King” ou “de Agatha Christie”, e isso já significar um determinado tipo de literatura de qualidade, quase como um gênero em si. Ninguém pergunta, por exemplo “...essa Mercedes é boa?” Mercedes já dá um tom de excelência em si. Eu busco essa excelência. Contar boas histórias vem sempre atrelado ao saber contar, e isso eu atrelo aos meus textos. Por isso, um “jovem leitor”, como inserido por você, provavelmente vai gostar mais de um texto meu do que de outro cara menos preparado de quem ele viu muita propaganda na internet e tem fã-clube, sabe-se lá como.
Não sou um cara simpático, não fico fazendo amiguinho no Facebook para tentar vender o peixe, ou aliciando blogs dando livro de graça para obter uma boa crítica incondicional. Acho isso até um tanto antiético. Sou escritor, não vendedor de cigarros. Acho o boca-a-boca de meus livros algo importante demais, isso sim. Gente que lê meus textos vai continuar lendo por ser algo que valha a pena e vai contar para os outros que talvez tentem ver se a recomendação é válida e assim vou ganhando mais leitores.

Fontes da Ficção – Quais são seus novos projetos?
Albarus Andreos Estou começando a fazer leituras críticas e seleção de originais para a Draco, o que está me dando muito tesão. Analisar textos e poder garimpar talentos parece que está na minha veia, sei lá. Estou gostando demais de poder ter contato com os autores nacionais, propondo alternativas, apontando erros e caminhos. É muito legal.

Fontes da Ficção - Vamos fazer um pequeno Bate-Bola?
Albarus Andreos Posso dar carrinho?

Fontes da Ficção - Tipo de Música Preferida:
Albarus Andreos – Rock
Fontes da Ficção - Melhor Cantor(a) Estrangeiro(a):
Albarus Andreos Fred Mercury
Fontes da Ficção - Melhor Cantor(a) Nacional:
Albarus Andreos Renato Russo.
Fontes da Ficção - Melhor Filme Estrangeiro
Albarus Andreos King Kong (na versão de 1933)
Fontes da Ficção - Melhor Filme Nacional:
Albarus Andreos O Auto da Compadecida
Fontes da Ficção - Duas Influências Literárias Estrangeiras:
Albarus Andreos Bernard Cornwell e Susanna Clarke
Fontes da Ficção - Duas Influências Literárias Nacionais:
Albarus Andreos – Monteiro Lobato e Machado de Assis
Fontes da Ficção - Comida que mais gosta:
Albarus Andreos Arroz com feijão, bife acebolado, ovo frito e tomates.
Fontes da Ficção - Carro dos sonhos:
Albarus Andreos Brasília 1976 (amarela, com roda gaúcha)
Fontes da Ficção - Objetivo na vida:
Albarus Andreos Sobreviver ao mundo, enquanto der, bem, até o fim.

Fontes da Ficção - Obrigado pela entrevista e fique a vontade para suas palavras finais.
Albarus Andreos Agradeço imensamente ao Fontes da Ficção por esta oportunidade. É muito bom saber que estão de volta, bombando e ativos. Nós precisamos muito de vocês!

Informações Úteis
Site do Autor: www.meninadabahia.com.br
Contato com o Autor: albarusandreos@gmail.com

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