sábado, 26 de maio de 2012

Uma Fagulha do Despertar

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Matheus corria ofegante pela floresta, se é que podia chamar aquilo de floresta. Suas pernas doíam, já não obedeciam aos seus comandos. Faltava-lhe ar. Sentia pontadas nos pulmões, acreditava que a qualquer momento cairia sem fôlego e não conseguiria mais correr. O coração estava tão acelerado que perecia sair pela boca.
– Meu .. Deus … o que são essas … coisas … o que elas querem de mim? –  Falava a si mesmo, com muita dificuldade, virando a cabeça para os lados, tentando ver alguma coisa à sua retaguarda. Tropeçou em um galho seco, indo direto ao chão acinzentado.
– Onde eu … estou … socorro … socorro! – Os gritos não saiam.
Levantou-se e tentou correr, mas era impossível. As grandes árvores sem folhas e de troncos negros pareciam interromper a passagem, formando um grande labirinto, fazendo o jovem desviar o caminho da corrida a todo  momento. Ouviu o bater das asas de seus algozes. Eles se aproximavam.
– Socorro … socorro! – Tentou novamente gritar, mas foi em vão. Sua voz saia cada vez mais fraca. Caminhou cambaleante até alguns troncos maiores, que jaziam no chão. Deixou o corpo escorregar, até desfalecer naquela terra escura e fétida.
– Não… não … não pode .. ser. Como … vim parar … aqui … como?
Sua visão ficou turva; o céu enegrecido parecia ficar cada vez mais escuro. Deixou a cabeça se chocar contra o chão. Ouvia as criaturas chegando, emitindo sons muito estranhos, hora parecendo gritos, hora uivos. Podia ver os clarões rubros no céu, trovões talvez, ou não. Não sentia mais os membros inferiores, devido à corrida desenfreada. Sua cabeça girava como se tivesse em um daqueles brinquedos do parque de diversões. A voz calou-se de vez. Mal conseguia abrir a boca. Já esperava pelo fim. Desistia de lutar pela sobrevivência. Não podia mais. Tinha sido vencido pelo próprio corpo.
– Levante-se garoto! Levante-se! – Uma bela voz feminina ecoava em seus ouvidos, tirando-o momentaneamente de seu estado de quase torpor. Levante-se! Era só o que aquela voz repetia.
Com muita dificuldade, conseguiu se levantar. Apoiou o braço esquerdo em um dos troncos e firmou os pés. Olhou para o caminho de onde veio. Seu corpo gelou. Ficou estacado no lugar quando avistou seus perseguidores. Eram imensas aquelas criaturas. Grandes panteras negras, com olhos vermelhos e asas de morcego. Gigantescas asas de morcego. Babavam uma espécie de gosma esverdeada, que formavam pequenos buracos quando encontravam o chão, uma substância corrosiva, ácida, mortal. Elas vinham com extrema velocidade e agilidade, não haveria mais chances de correr. Algo dentro dele o impedia de sair do lugar.
– Meu Deus …
As criaturas aproximaram-se com vôos rasantes. Matheus sentiu o cheiro fétido, que veio junto ao bater de asas, daqueles seres. O vento provocado por tal movimento levou o jovem novamente ao chão. Elas pararam em pleno ar.
O pânico e o terror tomaram conta do garoto. Ele olhava aqueles seres infernais. Queria gritar. Fechou os olhos. Não sabia mais o que fazer. Não conseguia mais raciocinar. Achava que tais criaturas só existiam em filmes. Mas agora, estavam de frente pra ele.
Começou a rezar. Nunca fora religioso. Não acreditava em Deus, zombava de suas irmãs que freqüentavam a igreja. Nunca acreditou … até agora!
Elas pousaram a sua frente. De tão grandes, pareciam estar sobre ele. Pressentiu o fim. Sabia que a qualquer momento elas atacariam e o fariam em pedaços. Tentou levantar-se devagar, mas foi impedido com um golpe certeiro no peito, desferido por uma das criaturas. A força empregada pela pata daquele bicho fora descomunal. Matheus sentiu seus ossos quebrarem. O grito finalmente saiu, mas agora foi um grito de dor.
Uma das criaturas desferiu uma mordida certeira na coxa direita de Matheus que quase desmaiou de tanta dor. Olhou a criatura segurando sua perna. Sua consciência falhou, quase apagou novamente com a visão que teve. A criatura soltou sua perna. A dor era insuportável. Agora sim era o fim.
– Acorda Matheus! Acorda seu preguiçoso!
Matheus levantou o corpo de repente. Sua cabeça girou ao abrir os olhos. A luz do quarto o fez levar a mão aos olhos. Estava assustado, no chão, todo suado. Olhava de um lado para outro, procurando pelas criaturas que lhe atacavam.
Lúcia segurou a cabeça do irmão e olhou bem nos olhos, com um sorriso de gozação no rosto.
– Você estava tendo um pesadelo irmãozinho, e bem feio, pelo jeito. Até caiu da cama. Vamos, tome um banho, a mamãe já colocou o café da manhã, e você sabe como ela fica brava, quando atrasamos.
O garoto jogou o corpo ao chão novamente. Estava aliviado, mas a sensação de que tudo aquilo não tinha sido um pesadelo ainda o atormentava. Não era a primeira vez que teve um pesadelo assim, apesar desse ter sido o pior de todos. Já fazia alguns meses que eles o perseguiam. Mas hoje foi diferente. Foi algo incrivelmente real.
Após tomar um banho rápido, colocou uma roupa qualquer e desceu. Tudo estava em silêncio, lá em baixo. Ao chegar na cozinha …
– SURPRESA! Feliz aniversário Matheus! – Seus pais e as duas irmãs estavam reunidos, em volta da mesa do café. Um bolo, com velinhas coloridas, a mesa, e a cantoria de parabéns começou. Alguns minutos depois, todos já haviam devorado suas fatias de bolo e já saiam para trabalhar.
Sentado, pensativo, Matheus levou a mão à sua coxa direita. Estava formigando, um pouco dormente. Alguns segundos depois, pequenas pontadas começaram na mesma região. O garoto levantou a bermuda e ficou branco, com a visão. Inúmeras cicatrizes percorriam a região, onde a criatura de seu pesadelo mordera.
A dor ficou mais forte. Matheus começou a suar frio novamente. Todas as imagens daquele pesadelo vinham fortes em sua mente. Podia sentir os cheiros, lembrar cada detalhe daquela perseguição horrível. Uma dor insuportável atingiu seu peito, sentia seu tórax afundar em seu corpo, sentia novamente seus ossos quebrando. Foi ao chão, derrubando cadeiras e tudo o que estava em cima da mesa do café. Seria agora o fim? Ali, na cozinha de sua casa, sem nenhuma criatura o perseguindo, sem nenhuma ajuda de seus familiares?
– Desperte Matheus! Desperte agora garoto! – Novamente aquela voz feminina ecoou em sua mente. Agora mais nítida, clara, mais real! A voz era extremamente bela e delicada, trazendo um certo conforto ao seu sofrimento, mas não podia negar, definitivamente, aquilo não foi um pesadelo!

====================================SOBRE O AUTOR DEBUTANTE

TIAGO CASTRO

  Designer Gráfico, estudante de Comunicação, blogueiro e aspirante a escritor de Literatura Fantástica, em 2007, criou o Blog Insônia onde escreve artigos, resenhas e matérias sobre literatura, quadrinhos, cinema e cultura pop em geral.


Alegoria da Maldade

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  1350 a.C., dia das trevas.

            Faltava pouco para a batalha começar: os demônios marchavam incessantemente em rumo a colina de Zahur. Meu povo humilde e desprovido de armas, apenas aguardava a chegada daqueles que lhes tirariam a vida e, próximo do nosso altar aos deuses Sol e Lua, em cima de uma pedra no alto da colina, eu os observava: de um lado, meu povo; velhos, crianças, jovens e casais. Do outro, marchando com firmeza, a tropa dos demônios em seus robustos e fantasmagóricos cavalos. O farfalhar metálico das armaduras e armas e o tropeio dos cavalos eram irritantes, mas o brilho das espadas refletidas sobre a irmã Lua, riscavam a noite como grandes pirilampos, fazendo-me lembrar dos tempos de criança, quando corríamos à noite nas colinas de Zarcar em busca destes insetos que brilham. Sim, o tempo passou como um relâmpago. Naquele fatídico dia eu era um homem de três décadas, casado com uma mulher muito especial e pai de sete maravilhosos filhos. A morte caminhava lentamente, e nada poderia impedi-la e muito menos cessar o inevitável, a não ser algo estranho e inesperado que surgia de minhas entranhas; amargo, odioso, perverso e quente. Eu sentia meu sangue ferver nas veias como uma grande torrente, e com os punhos fortemente fechados, aguardei na entrada da vila a chegada da morte, enquanto que meus contemporâneos apenas observavam minha estranha fisionomia, semelhante daqueles que caminhavam para nos destruir… Alguns jovens pareciam ter sido contaminados com a minha febre, e ficaram atrás de mim, de punhos fechados e dentes cerrados. O som da morte ficava cada vez mais próximo. Podíamos sentir o chão vibrando no mesmo ritmo das batidas dos nossos corações. Eu permaneci intacto, diferente das minhas veias que freneticamente tentavam saltar do corpo. O chão estremecia cada vez mais. Quantos demônios marchavam em nossa direção? Dois mil? Três mil contra apenas duzentos humildes camponeses desarmados? O que fizemos para os deuses para termos tamanho castigo? O que os meus punhos poderiam fazer contra centenas de demônios poderosos e armados?… O som do inferno estava tão próximo, que não podia mais ouvir as lamentações dos velhos nem o choro das crianças e, logo, avistei os primeiros seres da morte vindo em nossa direção; truculentos, altos e selvagens. Por um momento que durou uma eternidade, o tempo parou. Eles pararam de marchar. O chão não mais estremecia, mas ainda podia ouvir ao longe o soluço das nossas crianças, e as batidas do meu coração se intensificaram de tal maneira, que poderia senti-las em minha face.  Um deles, carregando uma bandeira negra com um símbolo de um deus profano, caminhou em nossa direção, parou e vociferou versos infernais. Quando lhe faltou palavras, numa cena dantesca, com os olhos vermelhos, arregalados e lacrimejantes, olhou para nós e iniciou um tétrico gargalhar, como se estivesse possuído por uma estranha entidade, pois o som que emitiu foi tão agudo, que estremeceu minh’alma. Ele ergueu ainda mais o braço, para que, sem exceções, todos visualizassem a tétrica estampa da sua bandeira, quando que de trás dele, centenas de amaldiçoadas flechas com pontas de fogo foram arremessadas, atingindo grande parte da população, queimando nossas casas e nossas vidas. Eles  gritavam e gargalhavam, algo que só os demônios deveriam fazer nas cenas da morte. Em questão de pouquíssimo tempo, ninguém mais estava atrás de mim; todos mortos, decapitados e desfigurados. Saltei por cima do primeiro demônio, e com uma força hercúlea, o estrangulei, chamando atenção de outros dois que vieram rapidamente em minha direção. Peguei a espada do que matei e quase cego de ódio, desferi golpes ágeis e certeiros, deixando mais dois corpos ensangüentados no chão. Eles não eram demônios como eu imaginara, pois possuíam nossas mesmas feições, sangravam e tombavam como nós…. Formei um círculo de corpos em volta de mim, como uma pequena muralha de carne e ossos. Minhas roupas estavam tingidas de sangue. Meu paladar sentia o gosto amargo do respingo do sangue deles. Meus pés, mergulhados em poças de sangue, tornaram-se escorregadios.  Naquela noite, perdi a conta de quantos mandei para suas moradias, provavelmente nos confins do inferno, mas, chegou um momento em que meus olhos não agüentaram a ardência do fétido e maldito sangue dos adversários. O peso da espada tornou-se insuportável; não conseguia mais erguê-la. Minhas pernas estremeciam e fraquejavam cada vez mais, mas, foi somente quando vi minha amada esposa e filhos mortos, que perdi a guerra. Pois nada mais fazia sentido para mim… Fui espancado, acorrentado e humilhado, enquanto ouvia a zombaria dos inúmeros covardes soldados.
Fui o único sobrevivente do meu povo e, após saquearem nossos poucos bens, fui levado pelos demônios e caminhei por vários dias, sem comer ou beber. Perdia as forças constantemente. Desmaiava e acordava, devido a intensa dor de ser esfolado, quando o  cavalo me arrastava no arenoso e trepido terreno. Eles se divertiam e gargalhavam com a minha lastimosa e degradante situação.

(…)

Após dias de tortura, chegamos ao escuro vilarejo dos maltrapilhos demônios; um lugar terrível, onde a carniça era visivelmente espalhada a esmo. Todos os malditos vieram receber os guerreiros com euforia. Fui levado como um grande troféu até o centro do local; um campo aberto onde poderia acomodar todos eles. Enquanto era preparado para ser enforcado, algumas crianças cuspiam e atiravam pedras em mim e, após todos os espasmos de euforia, inevitavelmente, fui enforcado… Mas adianto-lhes que para o céu não fui convidado e do inferno facilmente escapei.

(…)

É com grande pesar que vos escrevo e relato que foi naqueles dias que aprendi o que era a maldade. Meu coração petrificou-se por completo. Meus olhos perderam o brilho. Minha voz ganhou uma tonalidade intensa de rouquidão, enquanto que minha feição tornou-se sombria e, o amor? É apenas uma palavra encontrada nos contos de fadas… Hoje sou um espírito errante, caminho incessantemente em busca de algo… Sim, algo que me faça entender o porquê dos deuses terem criado esse terrível sentimento intitulado Perversidade.
Essa é minha história, este sou eu; perverso, odioso, poderoso e eterno. Posso ser chamado por vários nomes: Diabolus, Belzebú, Baphomet, Lúcifer, Barrabás, Satanás ou mesmo Anjo Caído, tanto faz…  Caminho através dos séculos em busca de vingança, mas, se um dia cruzar contigo, reze para os seus deuses que eu enxergue apenas a bondade em seus olhos, pois o fio da minha espada é cruel, vingativo e certeiro… 

FIM

=================================SOBRE O AUTOR DEBUTANTE

ADEMIR PASCALE

     Lingüista, crítico  de  cinema,   ati-vista cultura, escritor, professor de informática (LINUX), idealizador do projeto de inclusão social VÁ AO CINEMA e do zine TerrorZineMinicontos de Terror e editor do portal Cranik (www.cranik.com), é também autor do áudio-livro Cinema – Despertando seu olhar crítico (Editora Alyá). Já publicou seus contos em diversas antologias, organizou a coletânea Nos labirintos da Escuridão, está com o romance O Desejo de Lilith - Revelações em um diário no prelo e organiza a coletânea de novelas para a obra Invasão – Fic Science Edition da Giz Editorial.





A Um Passo do Suicídio

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       Sete minutos se passaram… Pode parecer pouco tempo, mas para alguém que galgou dez andares, totalmente decidido a interromper o curso da própria vida, é tempo demais.
      Assim que alcançou a beira do terraço do prédio, seu Alexandre – como é conhecido no bairro onde mora – foi tomado por uma covardia que não esperava. Estranhou o sentimento já que, meia hora antes, estava tão determinado. Naquele momento, já não tinha certeza se realmente era aquilo que pretendia fazer.
      O nervosismo, juntamente com o sol de verão da cidade de São Paulo, fazia com que transpirasse como um louco. Nesta época do ano, 35 graus não é temperatura incomum para os mais de dez milhões de paulistanos. Com isso, as roupas do homem já se encontravam coladas no corpo. Seu braço enfaixado por conta de um tiro que levara há alguns dias, formigava, dando-lhe tremendo desconforto. Os olhos tomados pelas lágrimas, embaçam-lhe a visão, no entanto, ele perdia tempo olhando as pessoas lá embaixo, sem se esquecer do motivo de estar ali, preste a dar um passo e acabar com aquele sofrimento.
      Mesmo da altura em que se encontrava, os sons da cidade chegavam-lhe com clareza: buzinas, motores, o sino da igreja, gritaria da feira livre, a gigantesca estaca afundando o solo de um terreno onde um edifício era erguido – a menos de um quarteirão… Mas nada parecia capaz de tirá-lo daquele estado que se assemelhava com um transe.
      Como nos desenhos antigos da Disney, o bem e o mal pareciam disputá-lo, cada qual sobre um lado do ombro, numa luta verbal pela influência de sua próxima ação. Os fatos ocorridos nos últimos dias talvez tenham-no desequilibrado e traumatizado de certa forma. Então, num acesso de desespero, o suicídio lhe pareceu atrativo.
       Seu Alexandre ensaiou um passo para a frente. Reuniu coragem. Quando pensou em sua mulher hospitalizada em estado crítico, retrocedeu. Na sequência, estremeceu e um calafrio cruzou sua espinha ao evocar em sua mente a imagem demoníaca da criatura, que, há três dias atrás, surgiu das sombras, mostrando-se para ele e sua esposa num beco. Alexandre nunca fora um homem adepto da religião, igrejas, mas sempre acreditou em Deus. Por toda vida ouviu falar no juízo final, na guerra entre anjos e demônios, no purgatório, no apocalípse… Contudo, nunca imaginou que um dia, seus olhos veriam uma criatura do inferno. Mas aconteceu. E este ser, este demônio, talvez por zombaria, fazia uso da imagem de sua filha morta há mais de dois anos. E qual não foi o choque destes pais já de cabelos brancos, ao depararem com aquela visão.
      Três dias antes: à noite, não muito tarde – por volta das 20h30min – seu Alexandre voltava com sua esposa Márcia, da casa do rapaz que – estava mais do que certo – tornar-se-ia genro do casal. Todavia, os planos de unir as famílias, foram interrompidos pela misteriosa morte de Marcela. Passaram-se dois anos e André ainda exibia em seu dedo, a aliança de noivado, fato que preocupava a todos. André se recusava a seguir com a vida. Afirmava convicto que seu amor por Marcela era um sentimento maior do que qualquer coisa deste mundo e pensando assim, o rapaz de apenas vinte e cinco anos, não se relacionava amorosamente e não tinha uma vida saudável. Consultas com psicólogos tornaram-se uma constante. André parecia não se cansar de repetir que daria a vida para rever seu amor, nem que fosse por apenas mais uma vez.
       Atencioso, naquela noite, havia oferecido carona para os pais de Marcela, mas seu Alexandre recusara. Dissera que preferia ir caminhando, afinal, estava muito quente e sua casa ficava a apenas alguns quarteirões de distância. A insistência de André nada adiantou.
      O ar quente tomava a cidade de Santos – litoral de São Paulo. As ruas estavam molhadas, pois há pouco havia chovido. Chuva de verão: forte, grossa, entretanto, rápida. Não durara nem quinze minutos. Mas foi o suficiente para transbordar bueiros e formar grandes poças pelo caminho. Carinhosamente abraçados, Alexandre e sua senhora seguiram pelas ruas desertas. Conheciam bem a vizinhança, visto que residiam há muitos anos no bairro. Foi então que o improvável aconteceu. Um automóvel com dois ocupantes, depois de uma freada brusca, derrapou e parou próximo do casal de transeuntes. Estes se sobressaltaram. Um homem negro e um branco, ambos de camisetas regatas, ostentando diversas tatuagens no braço, desembarcaram do veículo e de posse de pistolas semiautomáticas, anunciaram o assalto. Não eram moradores do bairro, disso Alexandre tinha certeza.
      Exigiram carteira, relógio, jóias; o que houvesse de valor.
      − Não temos nada! − Alexandre falou sincero.
       Os bandidos não acreditaram. Elevaram a voz ameaçadoramente. Entre as gírias e os palavrões desmedidos, as ameaças de morte fizeram com que as vítimas entrassem em estado de pânico. E foi nesta hora que Márcia apelou para o emocional dos jovens bandidos. Péssima idéia!
       − Não faça isso meu filho… temos idade para sermos seus pais.
       Disse isso pousando a mão no ombro do rapaz branco, que usava uma corrente grossa de prata no pescoço e um boné de marca na cabeça. Este deu sua resposta agredindo-a violentamente no rosto com um soco. A mulher de quase cinquenta anos tombou no chão molhado.
       − Não tenho pai, nem mãe. − bradou o agressor.
       Num impulso, seu Alexandre partiu pra cima do assaltante, ocasião em que foi atingido no braço por um disparo efetuado pelo outro bandido. Sob gemidos de dor, o pobre homem recostou-se na parede pichada e descascada. Seus olhos foram dos marginais para sua esposa caída. Esta fitou-o com o olhar alagado por lágrimas. Enquanto os agressores apontavam suas armas, as vítimas permaneceram caladas, mudas. Pareciam aguardar o estouro do tiro que lhes tiraria a vida. E isso estava preste a acontecer, mas um rosnado chamou a atenção de todos. Vinha da escuridão de um beco adjacente. Intrigada, a dupla de marginais apertou os olhos, tentando enxergar além da obscuridade e avistar aquilo que, para eles, deveria ser um cão. Nesse momento, dois pontos rubros furaram a escuridão e o rosnado aumentou de intensidade, provocando medo não apenas na dupla de criminosos, mas também, no pobre casal.
       Em resposta ao agressivo bramido emanado das trevas, disparos saíram das pistolas mirando aquela direção e, por conseguinte, um silêncio se ergueu. O par de pontos rubros desapareceu, tal como o rosnado. Aqueles que empunhavam armas se olharam. Abriram um sorriso mudo. Estavam certos de que o animal alvejado, havia ido para o inferno. Estavam enganados!

Lamento de Amor Vampiro

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- Pobre de mim…
 Como posso viver mais um dia desta vida que não finda,
sem ter a quem amar?
Estou cansado de passar dia após dia
século após século, nesta solidão eterna.
De que me adianta ser Imortal e deter o poder dos elementos,
Se não posso amar?
Perdido em meus pensamentos, voo pela noite fria.
Num repente, sinto um doce e inebriante aroma suspenso no ar
atiçando meus instintos Imortais…
 Suave fragrância se evola flutuando convidativa a me atrair.
Trazendo a mim o cheiro indelével da tua preciosa dádiva.
Delicioso perfume mortal que aguça meus sentidos
despertando minha sede.
 Súbito, desvio-me de meus instintos sombrios,
Procurando apenas tua companhia,
Esquecendo-me de todo o resto,
Até de minha alma vazia.
- Ah, como posso transformar em minha a tua volúpia?
Absorver ardorosamente tua lasciva concupiscência,
Tornando-a, apenas minha?
Despudorados instintos me guiam até você.
Envolvendo-te em meu abraço,
Tomo-te de assalto, sem deixar que reajas.
Procuro, anseio tua boca…
Não fujas do meu laço.
Cubro então o purpúreo-róseo dos teus lábios
de meu rubro furor.
Com cálidos beijos,
te domino cheio de ardor.
Adorada, minha Amada, não mais uma reles mortal.
Agora serás, minha Eterna Rainha.
Aquela que fez renascer para a vida,
o coração que não mais pulsava.
De agora em diante serás minha, Adorada.
Minha amada, minha flor.
A senhora do meu Amor.

Desvelo-me,
esquecendo do que sou.
Morto-vivo sem alma, vampiro sedento
sem nada para dar.
Que desta vida, jamais soube o que fosse amar.
Um um ser vazio, sem vida, sem calor…
Sem nada, nem amor.
Mas, não perdi meu coração.
Apaixonado de fato me encontro,
refém da sua beleza.
Serei de hoje em diante,
seu “Amor Vampiro”
Um consorte eterno e dedicado…
Eternamente apaixonado,

- Amado.
Quem sou eu, para resistir a tua atração magnética e inebriante?
Sou uma pobre e infeliz mortal, que jamais soube o sentido do amor.
Agora vens a mim e dizes que me deseja e ama…
Confusa me encontro, temo não merecer-te.
Mas…
Envolta em sua teia, me embaraço.
Consciente da força sobre-humana que emana de ti.
De todo o pudor, me desfaço.
 Sinto, a rigidez da tua virilidade.
A força da tua luxúria percorrendo os limites da minha decência,
A dominar minha vontade.
O que fazer? Não posso resistir.
Fraquejam-me as pernas, o medo renego.
teu poder nubla-me o juízo.
Desatinada de paixão…
Me entrego.

Torna-me tua para todo o sempre.
Não haverá mais o amanhã de tristeza.
Enches meu coração de infinita alegria…
Destes vida a uma natureza, dantes vazia.
 Transforma a tôrpe mortalidade que jamais me fez feliz,
em passado.
Que nossa felicidade e amor sejam eternos,
para sempre abençoados.

======================================SOBRE O AUTOR DEBUTANTE 

NANA B. POETISA

        Pseudonimo de Adriana Barroso. Nasci na cidade do Rio de Janeiro. Iniciou como escritora em 1999, enveredando pelo romance e poesia, com destaque para a Literatura Fantástica. Criadora do site: †Clã dos Imortais† (http://literaturafantasticabrasil.ning.com)


Carne de Primeira

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Desde pequeno, me habituei com uma alimentação alternativa. Não digo que era uma má alimentação, pois era a única que minha família tinha condições de me dar. Nunca desfrutei de algum conforto e poucas foram as escolhas que fiz por vontade própria nessa vida. Tive uma vida miserável. Vivia nas ruas, migrando de um pontilhão a outro. Integrante de uma família numerosa, nunca soube ao certo quantos irmãos tive – eram tantos. Agradeço por ter um nome, pois eu definitivamente tinha pré-requisitos para ser apenas um número, ou então, ter algum apelido constrangedor. Bom, de fato meu nome não é algo que me livre de constrangimento, mas ter um nome já é um grande começo.
Mas vamos falar de alimentação, afinal, ela é o principal tema da minha vida. Meu principal cardápio, desde a infância, foi o famoso ‘pão velho’. Quando tínhamos sorte, comíamos pães sem bolor e esses dias eram raros. Mas com o tempo, a necessidade de comer carne aumentou e passamos a olhar os cães vira-latas e os gatos de rua, com outros olhos. Eu ainda era criança quando provei pela primeira vez esse tipo de carne. Já era um garoto quando aprendi a matar, limpar e a preparar a carne de um cão. Em pouco tempo adquiri habilidade para fazer o abate perfeito e a facilidade no preparo da carne me rendeu um apelido carinhoso: Cuca. Fui nomeado o cozinheiro oficial da família.
Honrando o apelido, criei novos cardápios e quebrei a rotina de nossa alimentação. Meu menu ganhou dois novos pratos: ratos ou ratazanas – eram os prediletos dos homens, por serem saborosos e por serem feitos como porções individuais – e pombos – mais pedidos pelas mulheres e crianças, por serem menores e serem considerados carne branca.
Vivíamos bem e nossa alimentação tinha melhorado, se comparássemos aos tempos do pão velho e embolorado. Sempre matei a sede com água de torneira, mas por ficar em contato direto com tanto sangue, passei a aderir o rubro líquido em minha refeição. Alguns me chamaram de louco, porém não dei ouvido a eles, o sabor era realmente atraente.
A família estava ficando cada vez mais numerosa e era preciso estar sempre mudando de pontilhão, a fim de acharmos a matéria prima, para matar a fome de tantas bocas famintas. Era muita fome para poucos cães, gatos, ratos e pombos, que cruzavam o nosso caminho. Éramos um bando de gafanhotos e não tardou para que começássemos a brigar entre nós. Nacos de carne eram disputados com selvageria – tínhamos nos tornado animais. A princípio, as brigas eram de socos e ponta pés, mas logo se transformou em lutas em que usavam pedaços de pau como arma. Alguém sempre terminava desacordado.
Certo dia, uma mulher – que não sei dizer se era minha mãe ou minha tia – morreu sem causa específica. Chamaram por mim e pediram para que eu me livrasse do corpo, já que tinha experiência em lidar com coisas mortas. Estava quase terminando de abrir uma cova rasa, num terreno baldio, para jogar o corpo, quando tive a idéia de atualizar o meu cardápio e tentar novas fontes de carne. Longe dos demais, preparei uma porção para provar essa nova iguaria. A diferença no sabor era notável e, diferente daquilo que estávamos acostumados, logo notei que aquela carne era muito mais saborosa. Era uma carne de primeira. Provei outra parte do corpo e logo identifiquei as regiões para ter os melhores resultados e os melhores cortes também.
Levei a novidade para minha grande família e a aceitação de todos me surpreendeu. Não podia deixar de abastecer aquelas bocas famintas com tão apetitosa carne e revelar a origem da mesma; precisava conseguir mais, e consegui. Durante as brigas familiares, tentava agitar, estimular a violência, provocar uma nova morte acidental, mas ninguém queria matar; afinal de contas, ainda éramos uma família. Mas eu tinha ambição, queria sair das ruas, queria abrir um restaurante e ter o meu próprio negócio; e para isso, precisava de carne.
Numa das noites, após uma briga, peguei meu facão de abate e me aproximei de um dos brigões. Não sei dizer se era meu irmão, meu primo ou outro faminto qualquer; desci a lâmina com violência em seu pescoço. Não senti pena, nem arrependimento; matar uma pessoa foi o mesmo que matar um cão, até mais fácil. Nos dias seguintes, o sumiço do sujeito já tinha sido esquecido e todos saboreavam uma excelente carne.
Como disse, meu objetivo inicial era sair das ruas e, para isso, precisava de dinheiro. Tinha prazer em matar e preparar a carne humana, mas não era capaz de roubar dinheiro de ninguém. Não nasci para assaltar. Como todos da família estavam extasiados com a excelente alimentação, nenhum deles quis abrir mão do padrão de vida que já tinham adquirido e não contestaram quando comecei a cobrar a comida. Eu era dotado de um conhecimento que ninguém mais tinha e por isso, foi fácil manipulá-los, para que roubassem dinheiro em troca de comida.
Ainda precisava da matéria prima, então, me concentrei apenas em matar. Comecei com alguns da família, mas logo parti para outros indigentes desconhecidos que ficavam na região. E bem… confesso que comecei a atacar pessoas que passavam pela rua – somente depois de terem sido aprovadas pelo meu olhar clínico. Através do estudo, sabia dizer se a pessoa daria uma carne de primeira ou não. Mas eu não roubei, em toda a minha vida nunca fiz isso. Ganhei dinheiro de forma limpa, honesta, fazendo o meu trabalho – que, modéstia à parte, fazia muito bem.
Nem preciso dizer o quanto meu plano deu certo. Nunca em minha pobre vida tinha visto tanto dinheiro em minhas mãos. Surgiram mendigos de todos os cantos daquela cidade para comer da carne especial. Algumas pessoas, de qualidade de vida superior ao da minha família, também vinham atraídas pela novidade e pelo singular sabor daquela carne. Fiz muito dinheiro, fiz muitas vítimas, mas não existiam corpos. Eu fazia um trabalho perfeito, não deixava traços, nem mesmo pistas. O crime sempre foi perfeito. Sem sobras, sem desperdícios – de cabo a rabo.
Com o dinheiro que juntei, decidi seguir meus sonhos. Em uma noite qualquer, peguei minhas coisas e parti. Abandonei minhas origens, minha numerosa família e os pontilhões. Eu parti.
Abri um simples restaurante, longe dali, mas ainda no coração daquela cidade tumultuada. Não queria ver as mesmas bocas famintas, queria novos clientes, queria disseminar a arte de apreciar a carne humana, onde tudo era muito bem aproveitado. O segredo do negócio foi o sigilo. Eu não contava a ninguém a origem da carne. Mas não pense que eu queria enganar as pessoas, de forma alguma. Longe de mim. Apenas queria oferecer o meu produto e saber a opinião de quem o comia, sem a influência da origem. Queria criar apreciadores da verdadeira carne de primeira. Para alguns clientes que questionavam, dizia: “Não julgue antes de provar!”. E funcionava, o cliente aprovava e não mais perguntava.

O Principe dos Vampiros



A pequena caravana seguia pela planície verdejante, escoltando a carroça de madeira que carregava a filha do rei de Oreon. Sophia ia casar-se com o príncipe herdeiro do reino de Troy, terras longínquas que margeavam os fiordes gelados ao norte, berço de bravos guerreiros de longos cabelos claros e trançados. Seu casamento havia sido acordado quando ela era ainda criança, seria um casamento de conveniência, arranjado para manter a paz entre os dois reinos que já haviam guerreado em passado não muito remoto.
Sophia tinha apenas dezesseis anos, mas já era uma bela mulher. Alta e esguia, longos cabelos negros e lisos, olhos negros como a noite, pele morena, herança de seu povo. Com ela viajavam alguns serviçais, suas aias de companhia e sua ama de leite, que a acompanhava a todos os lugares. Como segurança o rei de Oreon havia enviado uma escolta composta de dez de seus melhores soldados.O caminho até Troy era longo e perigoso.
Sophia não estava nada alegre em deixar sua família e seus amigos de infância para morar em um reino desconhecido. Mas as mulheres não tinham escolha, deviam cega obediência aos pais. Ela só havia visto seu noivo de longe, quando ele veio para oficializar o noivado, e não gostou do que viu. Ele era velho demais para ela, poderia ser seu avô.
No fundo de seu coração ela tinha uma grande esperança que algo acontecesse e impedisse seu casamento com o velho príncipe. E era nisso que pensava durante o longo trajeto pelas planícies de Oreon. Mantinha-se alheia a tudo, deixava-se ser lavada, penteada e vestida pelas aias. Seu pai fez questão de mandar fazer os mais belos vestidos e tudo que uma noiva pode precisar. Sophia não faria feio diante da corte de Troy.
Já estavam viajando há uma semana e conforme se afastavam de Oreon, a temperatura ia caindo gradativamente, mudando a paisagem e fazendo com que os grossos casados de pele fossem retirados dos baús. E com a proximidade das montanhas, chegavam os perigos. Diziam que havia grupos de salteadores e mercenários que atacavam os viajantes, além dos profundos precipícios que circundavam as estradas estreitas que atravessavam as montanhas geladas. Resolveram acampar mais cedo naquela tarde. Estava muito frio e já estavam no sopé da imensa cordilheira. Melhor seria seguir durante o dia. Após o jantar todos se recolheram para dormir. O dia seguinte prometia ser cansativo.
Lá pela meia noite, sob um céu estrelado e sem lua, foram acordados pelo barulho de cavalos e pela gritaria dos vigias.
– Cuidado, estamos sendo atacados. Cuidem das mulheres e cavalos.
Em poucos segundos o pequeno acampamento estava cercado de guerreiros vestidos com armaduras negras, não se via os rostos ocultos pela noite, pelas rígidas vestimentas e elmos. Sabendo-se em desvantagem, o capitão da escolta perguntou:
– O que querem de nós? Estamos viajando em paz.
Foi então, que o maior dos guerreiros de negro adiantou-se do grupo e disse:
– Queremos as mulheres e os cavalos.
– Mas que pretensão a sua.
– Ou elas vêm por bem ou virão por mal. Vocês decidem.
Ouviu-se o brado da escolta:
– Atacar!
O barulho das espadas sendo desembainhadas ecoou na escuridão. As mulheres estavam apavoradas dentro da carroça, menos Sophia. Para ela o que estava acontecendo era providencial. Ela via ali, uma chance de fugir de seu destino. A luta encarniçada do lado de fora da carroça parecia chegar ao fim, os guerreiros de negro eram muito superiores em número e força. Os poucos soldados de Oreon jaziam no chão, mortos ou mortalmente feridos.
O chefe dos guerreiros parou ao lado da carroça e saltou de seu enorme cavalo entrando subitamente na parte de trás onde estavam as mulheres que gritaram apavoradas. Todas menos Sophia que, empertigando-se, encarou o enorme guerreiro de frente, sem medo.
– O que quer de nós?
– Quem é você?
– Sou Sophia, filha do rei de Oreon e ordeno que nos deixe em paz.
– Ah, então você é Sophia. Estava aguardando sua caravana.
Rindo de forma gutural, o guerreiro simplesmente agarrou Sophia pelo braço e a arrastou para fora da carroça. Logo seus companheiros faziam a mesma coisa, cada um escolhendo uma mulher e amarrando-a para que não fugisse.
Antes de montarem em seus cavalos os estranhos guerreiros tiraram seus elmos, revelando as presas afiadas, e atacaram os únicos homens sobreviventes mordendo-lhes o pescoço e bebendo o sangue que jorrava copioso. Em alguns casos, mais de um guerreiro se alimentava no pobre corpo desfalecido. Um pouco depois sobraram apenas os corpos dilacerados e totalmente drenados. As mulheres gritavam enlouquecidas com a cena violenta e apavoradas com o que esperava por elas. Algumas desmaiaram e foram prontamente jogadas na garupa dos cavalos. Sophia não gritou e nem desmaiou, mas chorou por seus criados e pelos soldados de seu pai.
Olhou com ódio para o chefe dos guerreiros.
– Por que tamanha violência?
– Somos naturalmente violentos minha cara, somos vampiros e precisamos nos alimentar, não importa se matando pessoas inocentes.
Sophia já havia ouvido falar destes seres, mas pensava que era uma invenção dos antigos para amedrontar as crianças que não queriam ir para a cama. Lembrava-se que sua ama de leite contou algumas estórias sobre os vampiros para assustá-la e impedir que passasse a noite perambulando pelo castelo. E agora eles estavam ali, surpreendentemente reais.
– E o que quer de nós monstro?
Sem responder ele subiu em seu cavalo, pegou-a pelo braço e fez com que ela se sentasse em frente a ele. Não adiantou se debater, ele era forte demais. Os outros guerreiros seguiram o exemplo do líder e saíram a galope em direção as montanhas.
Por incrível que pareça, Sophia não estava com medo, sentia sim uma forte atração pelo homem alto e forte que a segurava tão firmemente colada à armadura dura e gelada. Cavalgaram por um tempo que pareceu uma eternidade até avistarem uma alta fortificação de pedras, encravada na montanha rochosa. Era um pequeno castelo, bem menor do que onde ela vivia com seu pai, mas um belo castelo rodeado por um fosso profundo.
Quando os cavaleiros se aproximaram do castelo, a porta elevadiça foi abaixada e todos entraram. A porta fechou-se logo depois, isolando-os do mundo lá fora. Os guerreiros desmontaram e saíram arrastando suas mulheres entrando em pequeninas casas de pedra sem janelas. As mulheres gritavam como loucas, mas não escaparam de seu destino.
– O que vão fazer conosco?

O Livro Negro dos Segredos


 


TITULO:         O Livro Negro dos Segredos 
AUTOR:         F. E.  Higgins
EDITORA:     Record
N° Páginas:   272
ISBN:             978-85-01-08153-7 
Gênero:         Literatura Fantástica – Suspense

Autora 

F. E. Higgins, nascida em Londres, mudou-se para a Irlanda aos 7 anos. Após terminar a Universidade de Dublin, voltou à Inglaterra, onde reside em uma casa do século XV.
O Livro negro dos segredos é sua primeira obra, seguida por “The Bone Magician” e “The Eyeball Collector” ainda sem tradução. 

A Obra 

     Fugindo de um terrível passado, um menino chamado Ludlow Fitch chega na calada da noite a um remoto vilarejo. O menino está prestes a descobrir que essa pacata vila pode oferecer tudo o que ele precisa: um lugar seguro para viver, amigos e um emprego, como assistente de um simpático e misterioso penhorista, Joe Zabbidou, que também chegou há pouco ali e que troca segredos e não bens por dinheiro.  A vila, chamada Pagus Parvus, esconde segredos que ninguém poderia imaginar… E o penhorista está disposto a pagar muito bem por eles. Joe delega a Ludlow a tarefa de registrar as mais perturbadoras confissões dos aldeões em um velho volume encadernado em couro: O livro negro dos segredos. Roubo de cadáveres, saques, assassinato. A população de Pagus Parvus tem muito a esconder.
     De onde será que vem esse dinheiro? Afinal o penhorista paga pelos segredos, mas sempre garante a seus cliente que não os venderá  e que os mesmos podem retirá-los pelo valor que receberam. Embora Ludlow queira acreditar em seu novo mentor, o mistério que Joe insiste em fazer em volta do motivo desses registros e sua recusa a interferir nas histórias pessoais ouvidas durante as madrugadas só levanta mais suspeitas no jovem aprendiz.
     E o que tem a ver com a história a existência da rã? Qual o motivo que a mesma é tratada com tanta deferência? Mas o que o enigmático penhorista não sabe é que, nesta cidade assombrada por seus próprios mistérios, quem guarda o segredo mais terrível de todos é o próprio Ludlow.
       Em uma história cheia de enigmas e segredos assombrosos e até mesmo um romance inocente e adolescente, F. E. Higgins constrói um vilarejo ao mesmo tempo perturbador e intrigante, que consegue captar a atenção do leitor irremediavelmente.
     Ao mesclar Harry Potter, Sandman, Lemony Snicket e Neil Gaiman, Higgins cria um mistério único e inovador, que vai agradar leitores corajosos de todas as idades. 

Rossana
Resenha de Rossana

O Ladrão de Raios (Percy Jackson e os Olimpianos)

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Título:            O LADRÃO DE RAIO (Percy Jackson e os Olimpianos)
Autor:             Rick Riodan
Editora:          Intrinseca
N° Páginas:   400
ISBN:             978-85-98078-39-7
Gênero:         Literatura Fantástica - Fantasia

O AUTOR

Rick Riodan, americano, nascido em 1964, leciona inglês e história em escolas públicas e particulares.

A OBRA

O ladrão de Raios, primeiro livro da série, já nos mostra que o autor tem muito a acrescentar na popularização da leitura dos clássicos.
Com um humor irreverente e humanizando as Divindades Olímpicas, temos uma obra que atrai pela inteligência e criatividade.
Quem poderia imaginar que a mitologia clássica pudesse ser tão acessível aos jovens?
Percy parece o típico garoto problema, disléxico e com déficit de atenção, só entra em encrencas que acabam em sua expulsão dos colégios por onde passou, mais precisamente, 6 nos últimos 6 anos.
No decorrer da historia descobrimos que ele é filho de um dos “Três Grandes” Deuses do Olimpo e por isso é perseguido e ameaçado por monstros.
Vemos então o conflito entre a “Realidade” na qual foi criado, sem monstros ou seres mágicos e a “Verdade”, sua origem semi-divina e mitológica.
Podemos fazer aqui um paralelo com Harry Potter, ou seja, os “humanos mortais” ou “trouxas” arranjam explicações muitas vezes absurdas para justificar fatos com envolvimento de monstros ou magia.
Imagine então, para um adolescente ser perseguido por monstros que não deveriam existir. Ninguém a sua volta percebe ou acredita nele e ainda se descobrir filho de um DEUS, isso sem falar que único amigo passou o ano mentindo pra você?
Temos ainda a existência de um acampamento de verão onde semi-deuses são treinados para missões, onde passam por situações adversas e aguardam o reconhecimento de sua paternidade para então receberem “A Missão”, aquilo que os fará reconhecidos como dignos aos olhos de seus pais divinos.
Se isso tudo não bastasse, ser envolvido em intrigas olímpicas, acusado de  roubo de símbolos de poder, viajar ao submundo, desafiar  O Deus Supremo, conhecer o verdadeiro pai, ser enganado pelo Deus da Guerra, ser traído por pessoas que considerava amigas, aliar-se a inimigos naturais e ainda sobreviver ao fim do verão.
O melhor do livro é o fato do autor mesclar as figuras mitológicas com o cotidiano à perfeição. Por exemplo, as Parcas, Senhoras do destino da humanidade, transformadas em três velhas sentadas em um balanço tricotando. Medusa, transformadas em vendedora de estátuas de jardim e muitos outros somados no decorrer da história.
Enfim, um livro digno dos “Doze trabalhos de Hércules”.

Rossana
Resenha de Rossana

Azazel

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Título:           AZAZEL
Autor:           ISSAC ASIMOV
Editora:        Record
N° Páginas:  222
ISBN:            85-01-03808-3
Gênero:         Literatura Fantástica – Fantasia 

O AUTOR
Falecido em 06/04/1992, foi reconhecido ainda em vida um dos “Três Grandes” escritores de Ficção Científica, juntamente com Robert A Heinlein e Arthur C. Clark.
Sua obra mais famosa é a série “Fundação”, também conhecida como a “Trilogia da Fundação”. Escreveu também outros gêneros e é uma dessas suas obras que irei abordar.

A OBRA
AZAZEL é uma coletânea de contos de ISAAC ASIMOV, primeiramente publicada em 1988. As histórias tomam a forma de uma conversa entre o autor desconhecido e um amigo chamada George, capaz de conjurar um demônio de 2 centímetros de altura, ao qual chama AZAZEL e que possui poderes fabulosos.
Dono de um gênio impulsivo, AZAZEL interfere na vida das pessoas causando inesperadas e hilariantes confusões.
Peço aos leitores que se lembrem ser esta obra uma coleção de sátiras humorísticas. Não esperem algo contrário por tratar-se de Asimov ou ficarão decepcionados. 
Azazel é um demônio bonzinho, que insiste que seus poderes devem ser usados para fazer o bem a outras pessoas, mas que acaba sempre em trapalhadas. 
Desde o primeiro conto “O demônio de dois centímetros” podemos ver que George é na verdade um falastrão! Diz-se descendente de uma família altamente aristocrática, mas sem recursos, considera-se intelectualmente superior a seu interlocutor e condescendente com suas limitações. 
Dono de um coração enorme e completamente desinteressado (imagina se isso é verdade!) utiliza maneiras mágicas descobertas por um de seus antepassados para requisitar a ajuda de Azazel em situações das mais variadas, interrompendo o pequeno demônio em situações por demais inusitadas. 
Sempre visando satisfazer a vontade de algum conhecido e adulando o pequeno demônio, George cria as mais disparatadas situações. Desde melhorar os reflexos de um jogador de basquete por quem sua afilhada Juniper está apaixonada até melhora a aparência de outra afilhada que só pensa em fazer o marido feliz, George tenta fazer a felicidade de seus conhecidos e as falhas, mas não reconhecidas como tal, sempre recaem sobre a impossibilidade de compreender a humanidade como um todo pelo demoniozinho.  
Em suas histórias vemos que os interessados em sua ajuda nem sempre possuem os desejos mais elevados ao solicitá-la, uma vez que em suas próprias palavras, George “acaba sempre atraindo confidências pela sua aparência de honestidade e nobreza”.
Passamos por situações de vingança, disfarçada em reconhecimento em “Uma noite de música” e “O sorriso roubado” nos remete ao “Retrato de Dorian Grey” onde o quadro pintado reflete a situação da alma de Dorian e no conto, uma foto tratada por Azazel suga toda a felicidade de Kevin, marido taciturno de Rose, afilhada de George que reclama que o marido anda muito fechado e gostaria de uma foto de um momento feliz para lembrar-se do por que se apaixonou pelo marido. 
“Ao Vencedor” representa Theophilus, ignorado pelas mulheres até Azazel mexer em seus feromônios (responsável químico pela atração entre macho e fêmea na natureza) e torna-lo irresistível até demais. 
Em “O ruído abafado” descobrimos uma possível causa para a extinção dos dinossauros não muito divulgada, mas que também pode acabar com a raça humana. “Salvando a humanidade” é o exemplo clássico de egocentrismo, onde para compensar a má sorte, um amigo de George (Meneander) deseja poder salvar o mundo através de sua má-sorte/boa-sorte após a ajuda de Azazel e fica com má sorte para computadores, ou seja, todos param de funcionar perto dele.
Assim seria possível após um evento apocalíptico tipo “Matrix”, onde as máquinas dominam a humanidade ou até mesmo “Exterminador do Futuro” onde as máquinas querem destuir a humanidade que somente ele fosse capaz de algo. Resumindo, acaba num hospício. Todos os contos sempre apresentam situações simples na vida de uma pessoa, algo que as torna infelizes ou assim acreditam até a interferência de George e Azazel, seja bloqueio criativo (”Uma questão de princípios”), timidez absurda (”Os males da bebida”), falta de tempo (“Tempo para escrever”), Medo de água (“Deslizando sobre a neve”) e outros.  Sempre filosofando sobre o que é certo e digno, fazendo pouco caso de seu interlocutor, George e Azazel, levam os amigos ao desespero após tentar ajuda-los da forma mais desajeitada possível. 
Trata-se de uma obra única do grande mestre de ficção, que nos mostra que nada pode superar o gênio.

 Rossana
 Resenha de Rossana